17 de setembro de 2012

Queremos continuar em Portugal ou não? (Parte 3)

Fruto de uma discussão muito proveitosa entre o Carlos Antunes , o Filipe Silva e eu, gostaria de deixar aos leitores um resumo do que foi escrito para que, em consciência, possamos considerar quais os argumentos mais fortes ou mais relevantes, ajudando assim à formação da nossa opinião:

Carlos Antunes:
- Os povos têm dificuldade em compreender o projeto europeu e suas vantagens
- A Europa está unida como hoje a conhecemos devido à boa intenção e visão de fundo dos políticos que temos e tivemos, corrigindo as vistas curtas dos povos
- Políticas de planificação centralizada e demasiada regulação não são desejadas
- A Europa precisa de se afirmar como uma potência à escala mundial que compita com as restantes
- Transitar uma despesa de 50% do PIB para 30% do PIB é desejável, mas realisticamente difícil de atingir, a não ser de forma muito gradual.
- Alemanha prefere prestar assistência aos fracos para manter a coesão mínima,e com isso fazer frente aos EUA que tudo fazem para tirar os holofotes das desgraças internas. Pelo meio a alemanha impõe austeridade para que se certifique de que estes sofrem e se ajustam tanto quanto for possível.
- A Europa fragmentar-se agora é um tiro no pé, e a Catalunha ao sugerir esse tipo de desígnios apenas se sente seduzida pelo caminho mais fácil
- Imprimir de forma controlada é melhor do que não imprimir, na esperança de que imediatamente antes da irreversibilidade se desliguem as impressoras.
- Atacar a dívida e sermos nós próprios a resolvê-la (austeridade a 20, 30 anos) é demasiado penoso para a nossa economia e no fim arriscaríamos a que os mercados não nos dessem a credibilidade desejada
- Nigel Farage joga em dois tabuleiros políticos: do UK e da Europa, fazendo tudo para descredibilizar o projeto Euro e a própria União Europeia

Filipe Silva:
- Planificação centralizada e excesso de regulação são a causa da estagnação económica
- Mercado pode fazer tudo aquilo a que o Estado se propõe a fazer
- O que a UE já faz: planificar e legislar em Bruxelas nas costas dos povos é já planificação centralizada
- Despesas a 30% do PIB é muito, devem ir, no máximo, a 20-25% (se não me falha a memória)
- É na diferença que evoluímos, ao contrário da hegemonia que a UE nos propõe como solução para uma Europa mais forte e coesa
- A classe política pensa muito mais nos seus interesses pessoais/grupo do que no eleitorado
- O projeto Euro tem pernas para andar, e pode muito bem funcionar como padrão ouro, se usado corretamente e sem interferências estatais
- Alemanha não está para ajudar hoje e repetir a dose daqui a 10 anos só porque os países mais fracos nada fizeram. PIGS ganharem competitividade é-lhes irrelevante.
- Regressar ao escudo é entregar a moeda ao poder dos políticos e aos seus desejos ilimitados de impressão e de desvalorização para pagar contas e inflacionar silenciosamente os preços.

Tiago Mestre:
- Os povos europeus construiram-se nas suas semelhanças e nas suas diferenças, tendo definido as suas fronteiras com sangue suor e lágrimas.
- As culturas que se desenvolveram são suficientemente diferentes na língua, nos costumes, na relação entre os pares, etc, que qualquer aproximação forçada entre estas deve ser muito cuidada, recuando sempre que se vislumbram choques.
- As culturas não mudam na escala temporal que a UE deseja, e ao implementarem projetos que forçam uniões entre culturas, logo à partida enferma desta má análise da realidade.
- A liberdade dos povos para errarem ou acertarem, se separarem ou miscigenarem é mais importante do que a sua obediência às políticas de elites que julgam saber o que é melhor para nós.
- A UE e o Euro nasceram com boas intenções. Mas o terreno está a mostrar que entre a nossa vontade e realidade vai uma grande distância, e para a encurtar, os políticos não olham a meios para atingir os fins.
- Se não fossem os credores a dizer basta, ninguém teria lançado os alarmes e hoje os deficits continuariam a roçar os 9 e 10% do PIB.
- A elite política precisa de mentir diariamente para que a coesão não se perca
- Fizeram e promoveram as asneiras e pedem-nos agora para as corrigir e liquidar, dizendo ao povo que são eles mais uma vez os salvadores da situação. Basta que confiemos na sua ilimitada sabedoria.
- A tática do dia-a-dia prevalece à estratégia do longo prazo, adiando-se sucessivamente as decisões difíceis
- Ajudar países como Portugal com mais dinheiro emprestado só promove mais dívida e juros exponenciais. É a rúbrica mais pesada ( 8 mil ano) sem contar com a SS (37 mil ano)
- O ajustamento da despesa e da receita para 30% do PIB é uma inevitabilidade. Pode ser pela hard way (em 3 anos), que eu prefiro, ou pela soft way (10, 20 anos), mas de uma maneira ou de outra isso irá acontecer
- O ajuste para 30% do PIB será catastrófico para as estruturas económicas e sociais existentes, contudo é um caminho que julgo valer a pena percorrer para que a sociedade portuguesa renasça novamente e se despegue das múltiplas influências que a Europa nos tem impingido desde o século XVI com a inquisição, a Renascença, o absolutismo, o protestantismo, o comunismo, as ditaduras, as democracias, os parlamentos, e sei lá que mais.
- Nenhum destes regimes/ideologias verdadeiramente nos serve e pelo caminho já nem nós próprios sabemos que regime é mais adequado à nossa maneira de ser e de estar. Teremos que escavar bem fundo no tempo para o encontrarmos.

Perdoem-me os dois se deixei alguma linha de raciocínio de fora ou se interpretei mal alguma ideia.

Tiago Mestre

6 comentários:

Vivendi disse...

Muito bem apanhado Tiago.

Já houve várias tentativas de união europeia e todos falharam.

A única união europeia que precisamos e a que pode funcionar é a troca de cultura e mercadorias com um natural equilíbrio entre as partes envolvidas.

Carlos Antunes disse...

Um bom resumo, no essencial, Tiago!

Vivendi, na minha modesta opinião - e, obviamente, cada um terá a sua de acordo com as suas vivências, formação e perspectivas de vida - a mera troca de culturas e mercadorias na Europa não chegará para termos um futuro risonho e sustentável em conjunto.
A Europa tem potencial para muito mais e não se pode limitar ao velhinho "mercado interno" (tipo E.F.T.A.) Deve ser, de novo, a "luz do mundo" como foi durante séculos (roubando de novo o protagonismo aos USA, que 2 guerras brutais no sec. XX lhe roubaram).
Quanto ao "natural equilíbrio entre as partes envolvidas", tenho dúvidas de que alguma vez tenha existido, ou que venha verdadeiramente a existir (basta ver como, nesta crise, foram tratados dois Estados soberanos - Portugal e Espanha - em que neste segundo caso, devido à sua maior preponderância política e económica, a crise foi gerida "com pinças", recorrendo a eufemismos e evitando sequer falar em pedido de ajuda/resgate para não ofender/estigmatizar - ao contrário do primeiro que foi simplesmente "cilindrado" pela Troika.
A vantagem de uma federação - na minha opinião - é que o superior interesse federal modera o protagonismo dos estados mais fortes: normalmente há um Parlamento de deputados (ou "Câmara baixa") que representa a população (e onde os estados mais populosos/mais fortes têm, naturalmente maior peso), e depois um Senado (ou "Câmara Alta") em que os Estados estão representados de forma mais ou menos paritária e aí os Estados mais pequenos ganham protagonismo (para os compensar pela sua soberania). E as leis têm que ser aprovadas nas duas câmaras (a da "população", digamos assim, e a dos "Estados"). No fundo concilia-se democracia (população), com soberania (estados) :)

Vivendi disse...

Caro Carlos Antunes,

Como quer fazer isso numa sociedade europeia envelhecida e cada vez mais dependente de matérias-primas e energéticas de outros quadrantes.

A realidade é que o mundo tornou-se global e com cada vez maior interdependências que escapam a um qualquer planeamento central.

A civilização ocidental vai passar de ator a espetador, pois onde antes havia riqueza agora sobra dívida.

Os novos players mundiais em destaque estão a oriente.

Não se admire, por exemplo, se de repente vir o maior banco privado português tendo como um dos maiores investidores uma participação de origem chinesa.




Vivendi disse...

Caro Carlos Antunes,

Como quer fazer isso numa sociedade europeia envelhecida e cada vez mais dependente de matérias-primas e energéticas de outros quadrantes.

A realidade é que o mundo tornou-se global e com cada vez maior interdependências que escapam a um qualquer planeamento central.

A civilização ocidental vai passar de ator a espetador, pois onde antes havia riqueza agora sobra dívida.

Os novos players mundiais em destaque estão a oriente.

Não se admire, por exemplo, se de repente vir o maior banco privado português tendo como um dos maiores investidores uma participação de origem chinesa.




Filipe Silva disse...

O saudosismo é forte, esta coisa de ser "a luz do mundo" é um bastante presunçosa, ainda andávamos para aqui com paus e pedras e o Oriente e Médio Oriente já tinham grandes civilizações, basta ver que os árabes da altura apelidavam nos de bárbaros.

Porque esta obsessão de ser superior culturalmente que os outros?
Já o Hitler queria que a sua raça fosse a dominadora e deu no que deu.

Os USA passaram a numero 1 não só porque os seus concorrentes ficaram devastados mas também porque na altura tinha o capitalismo de mercado livre mais dinâmico do mundo.

Ler o que ocorreu nos USA após a 2ºGM para perceber.

O problema do planeamento central é que se baseia no passado e nas suas visões (das dos planejadores) do mundo, para "construírem" o futuro.
O problema é que esta coisa de ser humano e ter um creatividade fortíssima tem o inconveniente de deitar por terra todo e qualquer planeamento.

A inovação, invenção cada vez mais forte das novas tecnologias muda o mercado todos os dias, torna profissões obsoletas, cria novas profissões, novas necessidades, etc..
Algo que é impossível a qualquer ser humano antecipar e prever e bem como ter toda a informação disponível.

Nós temos a mania de olhar para o passado ver, pegar nas nossas experiências e fazer previsões.

Por exemplo a SS em Portugal toda a gente fala dos velhos e que cada vez vão ser mais etc...

Mas e o impacto das medidas levadas e que ainda não foram e terão de ser levadas nos orçamentos futuros, a diminuição de rendimentos, de qualidade na saúde, de comparticipações, de ajudas para lares etc...

Eu penso que vai levar à morte alguns largos milhares de pessoas.

Como também penso que vamos assistir pela primeira vez as gerações futuras serão mais baixas que as passadas, porque grande parte da esperança de vida, e crescimento em altura dos cidadãos foi devido À divida, esta permitiu acesso a melhores condições de saúde, melhores condições de alimentação, etc....

O Português não tem ideia do que ocorreu, maioria quer a vida passada, algo que não é possível porque nunca a tivemos, foi emprestada.
Fala-se de reconquistar a competitividade perdida, estou para perceber como se conquista algo que nunca se teve?

Mesmo em relação À China, fala-se que a informação economica não é de qualidade, que os numeros são manipulados, muita corrupção por lá, etc.. quem hoje diz que serão o número 1, e até podem muito bem vir a ser, muitos eram os que diziam nos anos 80 o mesmo sobre o Japão.
Tanta coisa que pode correr mal na China, e tanta coisa vão ter de fazer.


A próxima decada vai ser muito interessante, não vai ser tão fácil como até aqui, mas vai ser bom estar cá para ver

Anónimo disse...

Caro Filipe Silva,

Como se comportariam os monopólios num economia de mercado livre?

Agradeço desde já a sua resposta.